Confissões de um abuso psicológico #tambéméviolência

Talvez o mais difícil seja suportar a humilhação… Não sei se é a de acreditar que de fato o que você fez, usou ou falou foi errado ou a humilhação de estar impotente diante da pessoa amada proferindo atrocidades contra você. As suas palavras entalam na garganta, as lágrimas embaçam a visão. E você se encontra impotente, emaranhada em uma rede de argumentos que arrastam cada vez mais para baixo, para o fundo do poço, mas você está tão presa a ele que não vê saída.

É, nem toda violência deixa hematomas e ossos quebrados. 3 em cada 5 mulheres sofreram, sofrem ou sofrerão violência em um relacionamento afetivo no Brasil, eu não fugi a essa estatística.

Foi um namoro curto, menos de um ano, mas pergunte para qualquer amiga minha e saberá o furacão que ele foi em nossas vidas – na minha e na delas que pacientemente davam os ombros para que eu não desabasse. Noites em claro, brigas e gritaria, xingamentos, lágrimas pelos corredores da faculdade, pressão psicológica, chantagem… Hoje chamamos o ex de “o sociopata” e o apelido não é exagerado.

Ele invadiu meu computador, instalou um programa, roubou meus históricos de conversas, alterou frases no Photoshop, criou um e-mail falso fingindo ser uma menina e passou semanas me chantageando com histórias e conversas que nunca tinham acontecido.

Passei a desconfiar da minha própria sombra. Desconfiei das minhas amigas. Duvidei até das minhas próprias lembranças. Passava horas chorando de soluçar ao telefone, explicando – em vão – para ele que aquilo não passava de uma pessoa louca tentando terminar o nosso namoro. Não conseguia me concentrar nas aulas, esperando o momento em que um novo e-mail falso chegasse com informações alteradas que eu teria que explicar mais tarde. Passei semanas me explicando por algo que eu não tinha culpa, aos prantos, sem saber ao certo como sair daquela situação. Fiquei neurótica achando que tinha alguém no meu quarto, no meu banheiro, me seguindo na rua, me observando pela câmera do computador – que até hoje, 7 anos depois, ainda cubro a lente com um adesivo por medo de ter minha privacidade invadida novamente.

Demorei muito para conseguir sair da defensiva, aquilo me consumia inteira, durante semanas aqueles e-mails eram tudo o que eu conseguia pensar, nada mais. Resolvi contra-atacar e descobrir por fim quem era a pessoa por trás dos e-mails. Chamei um amigo que rastreou o IP até uma lan house ao lado da casa dele. Entrei no jogo, comecei a responder os e-mails pressionando cada vez mais até que um dia coincidiu de eu ligar na lan house e ele estar lá bem no momento em que chegou um e-mail da tal menina.

Quando fui confrontá-lo ouvi de tudo. “Você é louca? Por que eu faria isso? Se você desconfia de mim é porque você que está fazendo coisa errada. Você é ridícula! Mas já era de se esperar mesmo, se comporta como uma vagabunda quando tá na faculdade, sai com roupa curta, fica chamando atenção… Você não passa de uma puta” Disso para xingamentos e mais xingamentos aos gritos, como se eu merecesse apenas o pior e nada mais.

Na época a pressão era tanta que eu não conseguia entender que de todas as pessoas do mundo era ele quem tinha a MAIOR obrigação de me defender e me ajudar, mas a única coisa que ele conseguia fazer era me atacar... E eu, presa na rede, não conseguia sequer olhar a situação de fora e perceber o quanto absurda ela era. Eu estava me afogando.

Uma noite, pouco depois, eu estava em casa me arrumando para encontrá-lo e minha melhor amiga me ligou, muito tensa, falando que estava vendo ele de mãos dadas com uma outra menina, subindo uma das ruas mais badaladas de São Paulo.

Confrontei, ele me contou mentiras, tentou me colocar contra minha amiga e disse que o mundo estava contra nós, mas que eu que não era forte o suficiente para encarar de frente e lutar pelo nosso “amor”. Escolher entre minha melhor amizade e um crápula não deveria ser difícil, mas era.

Cheguei a um ponto que eu só conseguia sentir raiva, repulsa, ódio, nojo e todos os sentimentos negativos quando estava com ele, mas ainda assim não conseguia terminar. Ele fazia todos os tipos de chantagem, desde “você é a única coisa que eu tenho na vida, você não pode me deixar, pelo amor de deus” até as pérolas como “você quer mesmo é terminar pra sair dando pra todo mundo”.

Cada dia eu me sentia pior, mal, triste, com uma agonia no peito e uma falta de ar que conscientemente eu não sabia explicar. Eu não achava que o culpado era ele, achava que EU é quem tinha problemas e eu tinha a OBRIGAÇÃO de ficar ao lado dele.

Foram alguns meses de terapia até que eu finalmente entendesse que o meu corpo era meu. Que o meu comportamento era um traço único de personalidade. Que eu não precisava carregar a culpa do mundo nas costas e que, assim como ele tinha sobrevivido sem mim até o começo do namoro, ele sobreviveria depois do fim… E eu também sobreviveria sem ele!

Consegui terminar com ele uma tarde, antes de uma viagem da faculdade que ele foi até a minha casa tentar impedir. Não sei se teria conseguido se eu não tivesse ido para outra cidade, rodeada dos meus amigos, com respaldo da terapia, mas eu consegui. Eu tive ajuda e hoje eu vejo que não há problema algum nisso, apesar da vergonha na época.

Na viagem, conheci o Gabriel, que ficou comigo pelos últimos 6 anos e restaurou minha fé na humanidade e nos relacionamentos. Meu namoro com o Gabriel também terminou, no começo desse ano, mas não foi por violência ou abuso, pelo contrário, terminamos amigos, que se respeitam imensamente e nutrem um carinho eterno um pelo outro. Terminamos com orgulho de dizer que durante 6 anos nunca sequer nos xingamos ou proferimos palavras agressivas um para o outro.

Durante esses 6 anos cresci profissionalmente, amadureci emocionalmente, descobri como é ser feliz plenamente, desenvolvi as minhas melhores habilidades e aprendi que, de fato, um bom relacionamento é aquele que te leva pra frente, que está embaixo para te segurar quando você cai e que te dá asas quando você quer voar.

É melhor estar sozinha do que mal acompanhada, mas que se estiver bem acompanhada a vida é muito mais gostosa. E isso, aprendi que é um relacionamento saudável e não como no anterior que só me deixou feridas e traumas. Um relacionamento que eu quero ter com a pessoa que vou casar e formar uma família, porque com um grau de entendimento e respeito mútuo  é possível que os envolvidos em uma relação evoluam e cresçam.

E por que estou contando essa história? Compartilho pouco da minha vida pessoal aqui no blog, mas hoje descobri que a ONG Artemis vai lançar a campanha #tambéméviolência (saiba mais AQUI) com o apoio da marca ativista LUSH. Há diferentes tipos de violência que calam e aprisionam milhões de mulheres diariamente no Brasil: violência psicológica, moral, patrimonial, física e sexual. Ainda não existem maneiras efetivas de denunciar agressores por violências silenciosas, que nem sempre deixam marcas visíveis, como foi minha história que carrego traumas até hoje. O ato é amanhã das 12hs às 14hs na Praça da Sé e às 19hs rola uma mesa de debates na LUSH Jardins, em SP.  

 

Quero convidar a todas as leitoras, para que venham fazer parte dessa discussão. Ao contar essa história tão pessoal, quis compartilhar com vocês algo que aprendi na marra: violência pode acontecer com qualquer mulher, não é uma vergonha, você não está errada e não precisa carregar isso sozinha. Um relacionamento não define quem você é nem todos os outros que você vai ter na vida. Existe esperança e com ajuda é possível sair de um relacionamento que te faz mal. Não se cale, você não está sozinha e nunca estará! 

 

BJÓN

C&A e a propaganda ENGANOSA: close erradíssimo!

Cara amiga gorda, você que acompanha esse e tantos outros blogs, se você ainda não viu a campanha da C&A, já aviso: NÃO SE ABALE. O que você vai ver é uma campanha de marketing mal feita, que tenta se apropriar da nossa luta para reafirmar ainda mais os padrões estéticos de magreza.

A modelo escolhida é a Malu, que veste 44/46 no máximo, ela é linda e talentosa, mas não é gorda e também não acredito que ela passe por um décimo das dificuldades e preconceitos que as gordas passam no dia a dia – como por exemplo tentar achar uma peça que sirva dentro de lojas de departamento, pra dizer o mínimo. Se o objetivo da campanha é mostrar que a indústria esteve errada por tanto tempo e que SIM a gorda pode ser sexy, por que raios a campanha resolve representar a gorda com uma mulher que NÃO é gorda?!?! 

O problema de uma campanha mentirosa – não nas palavras, mas na imagem – é que ela reafirma para todas as mulheres que AQUILO é o aceitável de ser gorda. Quer dizer então que ser magra é só se você vestir 38? Qualquer coisa acima do corpo de uma modelo de passarela, já pode ser considerada gorda?! OI?!?! Na verdade, o bonito pra gorda é na verdade ser magra… DE NOVO, GENTE?! Quando vamos parar?  Onde vamos parar?

Eu te digo: vamos parar em um monte de jovens com distúrbios alimentares. Vamos parar com um monte de mulheres infelizes com seus corpos, se submetendo a situações perigosas para mudarem o que veem no espelho. Vamos parar com um monte de mulheres traumatizadas se esgoelando na academia para serem uma gorda como a Malu OU para deixarem de ser gordas como a Malu e tentarem se encaixar em um padrão de magreza CADA VEZ MAIS MAGRO.

A Malu é linda, gente, mas ela não é gorda. E levar as mulheres a acreditarem que ela é só dá resultados ruins. Para as mulheres que não se aceitam e querem ser magras, faz com que esse objetivo fique ainda mais longe e ainda mais inatingível. Como ainda tem gente (muita, infelizmente) que considera gorda pejorativo, imagine o que pensam essas mulheres ao ver uma modelo como a Malu, que é só curvilínea, estampando a palavra gorda? Já estive no lugar dessas mulheres, quando eu era mais nova eu queria ser magra como a Malu, ter pernas finas e esquias, barriga sequinha, peitões. Aparentemente, seguindo essa campanha, eu nem sei onde eu iria parar, porque se a Malu é classificada como gorda, o que eu teria feito para ficar magra?! Reflita!

Para as mulheres que são gordas, faz com que a gente se sinta fora do nosso próprio segmento. Como se tudo aquilo que tem a ver com a nossa realidade – gordurinhas saltando para fora do jeans, culotes, celulite, gordura interna da coxa – ainda fosse algo realmente feio para se mostrar e, portanto, devesse ser substituído pela imagem mais magra de uma gorda que eles puderam achar.

Mais uma vez: eu não teria problema algum em ver a Malu estrelando a campanha de uma marca como a C&A, acho ótimo que as curvilíneas tenham seus lugares e torço para que a gente tenha uma diversidade maior de modelos mesmo! Mas já que é pra ser uma campanha cheia de representatividade, por que não colocam a Malu como curvilínea e uma modelo maior, como a Mayara Russi, por exemplo, como gorda?  

Ai, ai… A indústria da moda as vezes é tão cansativa. Se por um lado cada dia vejo mais inclusão, por outro vejo marcas e agências de publicidade tentando pegar carona nas lutas como um jeito de lucrar. Veja, eu não teria problemas com o lucro, contanto que finalmente a indústria fizesse com que cada garota se sentisse parte dela, mas a questão é que alguns closes erradíssimos só fazem com que nós, as margens da sociedade (gordas, negras, gays, trans, etc), nos sintamos ainda mais ERRADAS, como se até mesmo dentro da nossa própria causa, tivéssemos que mudar e nos encaixar dentro de um padrão.

Que vergonha! Que vergonha de ver uma marca se apropriar do nosso discurso de liberdade, do nosso discurso de aceitação, das nossas palavras de incentivo diário, para continuar a martelar nas cabeças das mulheres VELHOS E ULTRAPASSADOS padrões de beleza. 

Eu me sinto ultrajada e enganada. Não se engane: subjetivamente essa propaganda apesar da modelo plus size, não tem NADA de inclusiva e realmente só ajuda a reafirmar os padrões de magreza, mas fica a dica, segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor:

[blockquote author=”Idec, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor” ]De acordo com o artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), a ideia da publicidade abusiva está ligada à valores morais e atuais acontecimentos da sociedade. Em geral, é a publicidade que contém objetiva ou subjetivamente um discurso discriminatório ou preconceituoso. [/blockquote]

Bom, nem sei mais o que dizer sobre isso, mas como a blogueira Kalli Fonseca, do Beleza Sem Tamanho, falou: “nem precisamos pensar em boicote já que a marca já boicota as gordas, não tendo nada que nos sirva nas araras”… Isso porque não é a primeira vez que a C&A dá mancada com as gordas (relembre a campanha da Preta Gil aqui), vamos colocar uma gorda empoderada na equipe de marketing, vamos?! 

Infelizmente, é isso

BJÓN

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